Caso mostra como Lava Jato se tornou politicamente intocável

IGOR GIELOW/FOLHA

episódio Romero Jucá demonstra, caso alguém ainda tivesse dúvida, como a Operação Lava Jato tornou-se intocável politicamente. "Interferir na Lava Jato" é o novo "acabar com o Bolsa Família", "privatizar a Petrobras" ou qualquer outro bordão tóxico para políticos.

O que mais surpreende não é tanto o conteúdo das inconfidências de Jucá ou a tentativa de edulcorar a conversa, mas o fato de que políticos que se orgulham de seu propalado profissionalismo não tenham antevisto a confusão.

Jucá já era um dos mais enrolados líderes do PMDB na Lava Jato antes de assumir o Planejamento. Michel Temer insistiu em sua nomeação baseado na capacidade do correligionário de azeitar a coordenação dos interesses do Planalto no Senado, particularmente a agenda econômica, mas não só –Dilma Rousseff ainda será julgada pela Casa.

Temer menosprezou os riscos, e agora tem a primeira baixa de peso com pouco mais de uma semana no cargo. O mesmo critério levou o presidente interino a aceitar nomes sob suspeita no gabinete e uma figura como a do líder na Câmara, acusado até de tentar matar um vigia.

O peemedebista talvez não tenha outra opção. Mas agora terá de lidar com o reforço à desconfiança das intenções do seu PMDB em relação à Lava Jato, que já não era pouca, já que o partido divide com PT e PP o estrelato no rol de acusados no petrolão.

Efetivamente, o acordão sugerido por Jucá parece intangível, até pela quantidade de atores que teria de arregimentar –a começar por um certo juiz de Curitiba, delegados e procuradores.

Do ponto de vista estritamente legal, pode até ganhar o salvo-conduto da Procuradoria-Geral da República, instada a falar sobre o áudio com Sérgio Machado. Jucá sonha com uma "solução Hargreaves", referência a um aliado de Itamar Franco que foi afastado durante uma investigação e voltou ao cargo após ser inocentado. Na prática, contudo, sua situação é hoje incontornável.
Temer sofre um forte abalo de saída, já que Jucá carregava o software de negociação política da agenda econômica a ser anunciada nesta terça (24) por Henrique Meirelles (Fazenda).

É provável, inclusive, que toque o serviço com o terno de senador. Num Congresso em que a maioria dos seus colegas tem a mesma opinião dele sobre a Lava Jato, pode até funcionar –desde que ninguém fale em voz alta.

Temer vê aumentada sua dívida com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), desafeto e um dos últimos aliados a abandonar Dilma. Ele é central para o encaminhamento das propostas que cabiam a Jucá.
Ao menos até surgirem eventuais novidades; por sinal, Sérgio Machado era apadrinhado de Renan na Transpetro.

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