Edgar Moreno: do 'parir' uma crônica

Por Edgar Moreno
COSTA FILHO, João Batista da que também representa o heterônimo Edgar Moreno.


Meu caro leitor, confesso-te de antemão que esta é por agora a quinta tentativa de “conseguir” esta crônica de junho. E já te adianto que no fim hás de torcer o nariz por alguma insatisfação, quer de tema, quer de estilo. Segredo-te esses pormenores in off para que tu, somente tu, saibas quão sofrível é ao cronista “parir” uma crônica, esse espécime textual tão singular, que tem nos periódicos sua via populi de propagação.
Não meto aqui o prazo de entrega (que é hoje) e quero descartar a possibilidade d’essa criança tão nobre e vulnerável cair em mãos erradas, pois que, sendo tais mãos insensíveis ou meio leigas das Letras, dar-se-á de no dia seguinte ser jogada no primeiro lixão. Mas creio, que tu, leitor, não és desse tipo de gente que se fecha na ignorância da Arte e olha dos jornais apenas a frieza da notícia, a logomarca da tua loja, a coluna social onde se estampa teu nome e tua foto. Não, não hás de ser um egocêntrico feito Narciso, mas sim, um sábio e mediador semelhante a Toth.
É certo que nem tudo num periódico pode vir a te interessar. E temo, por minha parte, que antevejas meu escrito em tal conceito, a menos qu’eu ande na contramão de tuas boas escolhas. Bem vês, o mundo consta exatamente disto: de achismos e “pré-conceitos”, de bem-quereres e malquereres e de certos antagonismos que podem ensejar numa boa parceria.
Vai, pois, que isto já te esteja caindo nas graças de estilo, de estética, quando não, de mero passatempo!? E, se em meio a este texto, assim como vai, já te certifiques a ti mesmo que nada existe gratuitamente!? Que até das bobagens da vida podes extrair alguma sapiência!? Quiçá não já aprendeste mesmo a amá-lo, tal uma criança perdida e estranha que aos poucos se apodera do teu lar, tira o teu tempo, te dá ansiedades, mas no fim, tudo fazes para conhecê-la melhor, para defendê-la, para não perdê-la nunca!? Quem sabe não já te esteja assim este feto, gerado que foi no âmago do teu ócio de leitor sensato!?
Vê, tu, como são as crônicas: roubam-nos a essência inicial do pensamento e nos põem à boca coisas do seu próprio gosto e razão. Pois é o que digo: nada do que pretendia com este texto se me saiu até agora. Mas hei de revelar também que a verdade mais pura é que ao começá-lo, não cogitei um tema certo, pois nada me vinha à caneta que valesse dignidade textual. Mas quem disse que todo texto há de ser digno? E o que é um texto digno? A própria Teoria Literária, a Sociolinguística, sei lá o quê, me perguntariam sem resposta: Em que consiste a dignidade textual?
Calo-me para dizer apenas que a priori ansiava um texto compatível da coluna com as nuances das festas juninas. Ou algo sobre a banalização da vida, do casamento e dos valores hodiernos ou ainda sobre a escravidão virtual. Fiz ainda alguma frase, todavia, desisti dessas temáticas, cada uma por sua própria razão, e todas pelo mesmo motivo: o espaço da coluna. Deixo-as, pois, cá, comigo. É bruta matéria para outros amanhãs. Quanto à satisfação textual, já não há tempo para riso ou choro; prefiro a objetividade do bom inglês: For me, there is no problem.

Agora, leitor, permite-me, voltar ao topo do texto, relê-lo, cortar alguma palavra, enxertar outras e ver se lho encontro um título digno. Ops! Não há maior dignidade por agora que atender ao meu editor Jakson Silva em seu ultimato breve e suficiente: “Crônica. À espera”.

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