Edgar Moreno: Momento 44


Por Edgar Moreno
COSTA FILHO, João Batista da que também representa o heterônimo Edgar Moreno.

É manhã de segunda-feira, oito do oito de dois mil e onze. Tomo um assento e sento à sombra do meu muro. O silêncio das seis, de instante em instante é cortado pelo ronco dos motores e pelo crescente movimento das ruas transversais. A extensa Avenida “B”, que no fim ganha o nome de Brasília, faz-se a principal, e a Avenida “C”, sem muito movimento, vai dar numa casinha simples.


Hoje, nada de escola, nada de funcionários, nada de burocracia, nada de minha presença por lá. Pelo menos é o que penso e o que quero, ao menos hoje. O motivo é simples e justo: hoje é meu feriado nacional. Portanto, se o dia é meu, posso tirá-lo para o que quiser, quem sabe ler ou escrever alguma coisa. E antes que eu abra este livro de autoajuda posso então voltar 44 anos no tempo e vivenciar minha mãe com dores de parto, o povoado Livramento a receber seu mais novo morador. Meus pais com sua numerosa prole a receber seu nono filho. Que tal homenageá-lo dando-lhe o nome do próprio pai? E assim se fez.


O Dão, como me chamavam em família foi crescendo com a vida como fazem os meninos do interior, mudando de povoado, até os pais fixarem residência na cidade.


Num dos momentos de minha aguda coqueluche, a popular “tosse braba”, cheguei a morrer, até correr a notícia pelo lugar e me virem fazer a sentinela, mas papai, aflito e providencial, puxou pelo meu fôlego e me fez restabelecer à vida. Por volta dos oito anos quebrei o braço direito. Ai que dor! Ai que saco ter que passar muito e muitos dias com o braço na tipoia de talo e mastruz. O pior era o odor que a planta deixava. Coisas de papai, que também não media esforço para me levar à roça a fazer com ele as pequenas prendas. Ao me perceber mais grandinho já não gostava tanto dessa ideia, mas, sem opções, restava-me tirar da venda de estrume, ferro velho, limão e similares, meus trocados salariais com os quais comprava alguma roupa e tomava suco com pão na barraca seu Zé Baratão, até hoje na mesma vida. Um pouco pior.


Mas a infância não me foi apenas de trabalho e privação familiar de certas liberdades. Minha mãe, embora sem diplomas, sempre dispensou o cuidado com os estudos dos filhos. Não tinha luxo, às vezes nem para o bucho. Lembro-me bem: meus cadernos eram dos mais simples e baratos. Assim o eram também minha farda, meu lápis, meu ABC e tudo mais. Entretanto, isso não impossibilitou de me destacar nas turmas das escolas por que passei. E foi com orgulho e recompensa que me tornei o primeiro filho a receber um diploma de graduação, formando-me em letras aos 28 anos.


É certo que aí já eu tinha alguma experiência em outras fontes de trabalho como escritório de contabilidade (meu primeiro emprego formal), cartórios e restaurante até ingressar no serviço público como agente administrativo e mais tarde como professor.


Olhando agora para trás vejo que desde os ontens tenho sido um vencedor, um pequeno-grande homem, de quem o esforço e a persistência têm sido fortes aliados.


Hoje atuo como gestor de uma escola de porte médio, integro a ABL-Academia Bacabalense de Letras, uma instituição literária da qual já fui presidente por dois mandatos.


Casado há treze anos, tenho uma esposa que me apoia e dois lindos filhos (Ramiro, 12 e Olávia, 9) para os quais pouco disponho de tempo. Tenho muitos conhecidos e poucos amigos, sem tempo, é certo, mas sei que me admiram e me gostam à beça.


Minhas conquistas já o são numerosas, minha idade avança nos meus dias e meus sonhos caminham juntos altivos e renovados. Pretendo, não tão distante, possuir minha casa de sobrado e nela a minha “Sala-museu do Costa Filho” para a qual já conto com certo acervo (coleções, camisas, objetos, etc.), tudo muito arrumado e limpo. Sonho também adquirir uma casa no centro da cidade, onde as coisas acontecem mais de perto. Sobretudo, almejo aprender com a própria vida a dar seu real sentido a cada amanhecer, a cultivar sua harmonia no lar e proporcionar felicidade aos que me rodeiam.
Por fim, tudo isso não teria sentido e nenhum respaldo se aqui não reconhecesse a Deus como motivo maior de minha vida e a ele não declarar minha gratidão.

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