Tucanos de Minas atuaram junto a governos do PT por obra investigada


Divulgação - 2.dez.2015/MCTI
Narcio Rodrigues (esq.) e filho, deputado Caio Narcio (PSDB-MG), em reunião com o então ministro de Ciência e Tecnologia, Celso Pansera (centro), em 2015
Narcio Rodrigues (esq.) e filho, deputado Caio Narcio (PSDB-MG), em reunião com o então ministro de Ciência e Tecnologia, Celso Pansera (centro), em 2015

O ex-presidente do PSDB de Minas Gerais, Narcio Rodrigues, discutiu com o governo Dilma Rousseff (PT) a federalização da fundação Hidroex, estatal mineira suspeita de superfaturamento em obras e pagamento de propina em contrato.

Para referendar as tratativas, ele obteve a autorização do governador de Minas, o petista Fernando Pimentel.

As conversas foram feitas junto ao então ministro Celso Pansera (Ciência e Tecnologia), deputado federal pelo PMDB-RJ. O objetivo, disse Narcio em escutas telefônicas feitas pelo Ministério Público de Minas com autorização da Justiça, era construir "uma ponte para 2018".

"Com um ministro nosso, nós vamos para a voz de comando, botar gente inclusive nossa lá de novo, né?", disse Narcio a um interlocutor em novembro de 2015. Um ano antes, o PSDB tinha perdido as eleições para o governo do Estado, que comandava desde 2003.

Na dianteira da tentativa de federalização da entidade estava o filho do ex-presidente tucano, deputado federal Caio Narcio (PSDB-MG).

"O Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação passou a ser o irmão do Caio, né?", contou Narcio em outra ligação. "Viajou com o Caio lá para a França, e ficou encantado com o Hidroex, depois voltou e queria ir a Frutal (MG). Nós não queríamos deixar ele ir, achamos que ele tem que primeiro conversar com o Pimentel para não parecer que está atropelando".

A Hidroex construía um centro de pesquisas em Frutal chamado "Cidade das Águas", que tinha aval da Unesco e recebeu parte dos recursos por meio de convênios com a União. O local se propunha a ser referência em estudos hídricos no Brasil.

Após a deflagração da Operação Aequalis, que prendeu Narcio no ano passado, o governo mineiro fez uma reforma e extinguiu a Hidroex.

Pansera viajou com Caio e uma comitiva de deputados à sede da Unesco, na França, em junho de 2015, quando ainda não havia sido nomeado ministro. Ele era presidente da Comissão da Crise Hídrica da Câmara e diz que tentou assegurar que o centro não perdesse a chancela da agência da ONU.

O ex-ministro afirma que não chegou a ir a Frutal, mas tinha uma visão positiva sobre a obra. "A impressão que eu tinha [da Hidroex] é que era uma ideia muito boa e ele [Narcio] era um entusiasta dela, mas não contavam com a derrota do Pimenta da Veiga [candidato do PSDB ao governo de Minas em 2014] e do Aécio [Neves, senador, a presidente]", afirmou. "Pimentel deu uma secada na fonte de recursos e, por isso, buscavam a federalização."

Procurado, Caio Narcio confirma a informação. Ele diz que a federalização era necessária porque o próprio Pimentel informou a ele que o governo de Minas, em dificuldade financeira, não tinha dinheiro para bancar a entidade. Ele nega que tivesse conhecimento de irregularidade na obra e afirma que a operação "fez um estrago" com sua família.

Narcio Rodrigues é réu em duas ações penais sob acusação de fraude a licitação, organização criminosa, peculato, lavagem de dinheiro e de atrapalhar investigação criminal.

Segundo a acusação da Promotoria, a construção da Cidade das Águas foi superfaturada em ao menos R$ 8,7 milhões e Narcio teria recebido mais R$ 1 milhão em propina para financiar campanhas na eleição municipal de 2012. Nessa época, ele era secretário de Ciência e Tecnologia do governo Antonio Anastasia (2010-2014).

Em delação premiada obtida pela Folha, o empresário português Firmino Rocha afirma que seu sócio, o também português Bernardo Moniz de Maia, do grupo Yser, dizia ser pressionado por "Narcio ou seu filho" para que pagasse a quantia.

'INDÍCIOS DE ILEGALIDADE'
A defesa de Narcio Rodrigues nega que ele tenha cometido irregularidades e diz que o Ministério Público nunca obteve provas que justificassem a sua prisão. O advogado Estêvão Melo destaca que o próprio ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Reynaldo Soares da Fonseca, que determinou duas vezes a soltura de Narcio, encontrou "indícios sérios de ilegalidade" em sua detenção.

"Nunca houve pedido de propina e o Ministério Público não apresentou na denúncia qualquer prova que aponte o recebimento de dinheiro ilegal por Narcio Rodrigues", diz Estêvão Melo.

O deputado Caio Narcio, filho de Narcio Rodrigues, afirma que nunca pediu propina e não conhece o delator Firmino Filho. Ele diz que está tranquilo em relação ao processo e que não há provas de nada do que foi apresentado pela acusação à Justiça contra o seu pai. Caio não está entre os denunciados na operação.

Em nota, o governo de Minas Gerais afirma que, em audiência com o governador Fernado Pimentel, Narcio Rodrigues informou que havia interesse do governo federal em assumir a Hidroex.

"À época, o Governo de Minas Gerais externou que, caso a União confirmasse o interesse na federalização, o Estado não se oporia ao exame da proposta", diz a nota.

O PSDB de Minas Gerais tem dito que, durante suas gestões, "a orientação sempre foi para que todos os processos fossem feitos de forma transparente e seguindo os preceitos legais, com permanente acompanhamento dos órgãos de controle do Estado".

O partido defendeu que "todas as denúncias sejam devidamente apuradas pelos órgãos competentes e, uma vez comprovadas eventuais irregularidades, que os responsáveis sejam julgados na forma da lei".

"Sobre denúncia de que recursos ilegais possam ter apoiado campanhas eleitorais de prefeitos em 2012, o PSDB desconhece qualquer irregularidade que possa ter sido cometida por algum candidato", diz nota do partido. 

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